Sampa
Sábado é dia de faxina. Como não tenho secretária do lar, eu mesma cuido da limpeza da casa e divido as tarefas com Mendes, meu esposo. Limpo a parte interna e ele cuida da varanda e das plantas.
Para mim é até uma forma de relaxar. Limpando a casa, sinto que estou de alguma forma fazendo uma faxina interior. Gosto de escutar MPB. Escutava Caetano Veloso, exatamente SAMPA.
Pus-me a refletir. A vida nos prega muitas peças. São Paulo era a última cidade do mundo que gostaria de conhecer. Trazia esse preconceito. Sempre que pensava em São Paulo, imaginava uma cidade fria, uma selva de pedras.
Nos encontros e desencontros da vida precisei de São Paulo, não do santo necessariamente, da cidade.
A primeira vez que pus os meus pés naquela megalópole me sentia tão pequena que parecia que iria me engolir.
Hospedei-me num pequeno hotel, ao lado da Praça da República, bem no centro. Como não conhecia nada, procurei pela internet um local que que ficasse próximo ao hospital das Clinicas.
Chegamos de madrugada e até o taxista teve medo de estacionar o carro naquele local, devido o avançar das horas. Segundo ele, um local de muitos assaltos. Entretanto a necessidade era maior que o medo.
Já durante os primeiros oito dias, descobri uma São Paulo bem diferente do que pensava.
Depois encontramos um hostel mais próximo as clínicas. Hostel é uma pousada coletiva. O dono nos recebeu muito calorosamente e havia muitos estrangeiros. Era época do Lollapalooza, uma maratona de shows que acontece anualmente em São Paulo e atrai gente de toda nacionalidade. Muitas são as causas que nos levam à São Paulo. A alegria da juventude entusiasta se contrastava com a difícil situação que ora me encontrava.
Todavia a cidade me abraçava. As portas se abriam. A jornada não foi fácil, mas poderia ter sido bem pior.
Lembro de um dia em que estava tão aflita que paramos numa loja, eu e Normelia, e comecei a chorar. Ela com o coração gigante e amor de irmã, olhou para mim e disse: vamos chorar que aqui ninguém conhece ninguém. E choramos e sorrimos de toda aquela situação. Acredito que chamamos à atenção. Mas pouco nos importávamos.
Os médicos se apresentavam para mim como anjos enviados por Deus. Como o Plano de Saúde não cobria algumas consultas, tudo se tornava difícil. E quando contei ao médico, um dos maiores especialistas do país, toda situação, ele olhou para mim e disse: não se preocupe você pagará quando puder. Fiquei sem acreditar por alguns instantes, mas a misericórdia de Deus sempre foi maior que tudo em minha vida. Hoje ele é mais que um médico, é um amigo muito querido. E foi assim, numa longa e dolorosa jornada que descobri uma São Paulo, que já era cantada em versos por Caetano:
E foste um difícil começo
Afasta o que não conheço
E quem vem de outro sonho feliz de cidade
Aprende depressa a chamar-te de realidade
Porque és o avesso do avesso do avesso do avesso!
Por uma humanidade melhor!
Afasta o que não conheço
E quem vem de outro sonho feliz de cidade
Aprende depressa a chamar-te de realidade
Porque és o avesso do avesso do avesso do avesso!
Por uma humanidade melhor!
Jacqueline Braga