sexta-feira, 4 de outubro de 2019

COLUNA DA HISTORIADORA FÁTIMA ALVES - Fatinha Teles em Lições de Maria.


Fatinha Teles em Lições de Maria.

          

Quanta alegria em homenagear a poetisa, a escritora, a professora e historiadora! Uma pessoa que merece toda nosso carinho pela sua contribuição gigantesca na história e na literatura da cidade. Sinto-me honrada em publicar um pouco de MARIA DE FÁTIMA ARAÚJO TELES, 50 anos de idade de nossa Fatinha Teles a mulher do sertão e uma cidadã da nossa história cotidiana.







Maria de Fátima Araújo Teles, nasceu na cidade de Brejo Santo no ano de 1969.  Filha do casal Francisco Alves Araújo e Maria Neide Araújo Teles e seus irmãos Artur Napoleão de Araújo Teles e Núbia de Araújo Teles Rolim. Nasceu na rua José Nicodemos, nº 52 e fazem 50 anos que reside na mesma casa e rua. Fatinha relata que sua infância foi como as das crianças da época, como em toda cidade do interior, foi uma infância sem recursos econômicos, sua família não era abastada.  Seu pai diante das dificuldades não poderia encaminhar somente com a renda econômica dele, sua mãe resolveu ajudá-lo. Com 40 anos de idade, Dona Neide resolveu estudar e fazer supletivo, depois cursou a faculdade, e na época não era algo comum uma mulher na idade de 40 estudar e cursar uma faculdade. Fatinha descreve a atitude da mãe com orgulho, por ser uma atitude nobre e linda.


Com sabedoria, descreve sua infância: “Minha infância foi bonita, por que eu não pulei etapas, eu participei de todas as atividades de rua, todas as brincadeiras de rua, eu tinha uma turma na Rua Velha (Coronel Ferraz), uma turma na Rua da Lama (Padre Abath), eu tinha uma turma na Rua do Araújo, a rua onde meu avó morava e eu vivia muito lá, eu tinha amigo em todas as ruas, eu tinha amigo em todos os cantos”. Fatinha diz que as brincadeiras eram de queimada, de esconde - esconde, passa anel, e que foi uma infância feliz. Recorda o nome de algumas amigas e amigos, como Cardinale, Eugênia, Leka (filhas de Dr. Antonio), Artúrio, Ronaldo, Odinei, Gracinha de Chico de Cinézio, Rosângela (filha de Dona Marineusa), Tânia a prima, Alcicelide (filha de Zé Pedro Sapateiro), Edna Hélia, e assim em cada rua foi plantado uma semente da amizade.

Fatinha relata que sua mãe  não podia colocá-la para estudar em uma escola privada para ser alfabetizada, na época existia apenas a Escola João XIII, e Fatinha tinha o desejo de estudar na referida escola, mas por força das circunstância não podia.  Mas Fatinha tinha a determinação de aprender a ler, e todas as noites ficava lendo jornal para o seu avô José Teles de Carvalho (in memoriam). Fatinha descreve a cena com precisão: “Eu ficava deitada, com 4 anos de idade e ele perguntava o signo, e dizia leia o meu signo hoje, e eu ia soletrar o signo dele”. Mas aprendeu também com a Professora Norbélia Ambrósio, que morava perto da casa do avô, quase vizinho e por muita amizade, sua mãe pagava uma quantia pequena, inferior a mensalidade da escola privada, e tinha essa condição de pagar a Norbélia e além do mais eram amigas. Aprendeu a ler e foi alfabetizada pela professora Norbélia. Desde cedo, adorava revistas em quadrinhos, tinha uma caixa, aprendeu a ler correntemente lendo as revistas de Luluzinha, abre um parêntese na conversa e revela que já era feminista na época e não sabia por que Luluzinha tinha seu clube, lutava pelos direitos dela. Outras revistinhas importantes no desenvolvimento da leitura de Fatinha foram as Walt Disney, Tio Patinhas, Turma do Mauricio de Sousa a turma da Mônica. Adorava ler as revistas de Chico Bento, por ser da zona Rural, e o fato dele falar caipira, do sertão, palavras típicas do sertanejo e enquanto criança não influenciou no desenvolvimento da sua leitura em falar como o personagem, bem como o de Cebolinha que não falava os “R”. A Leitura se tornava normal, diante da linguagem desses personagens. Conclui dizendo que “Minha infância foi muito feliz, de criança pobre, mas extremamente feliz”.

A época da escola é descrita de maneira histórica, Fatinha fez parte das primeiras turmas da Escola Padre Pedro, na inauguração, no ano de 1976, na época a Diretora era Dona Bernadete, e sua professora do Primeiro ano, foi Marilene. Na época as salas eram divididas em primeiro ano “fraco” e primeiro ano “forte”, mas ela passou para o primeiro forte, porque sabia ler correntemente, e a professora do primeiro ano fraco era sua Tia Aurileide. Lembra das colegas de turma Aucicleide e Ana Paula Matos. Participou da banda da Escola Padre Pedro e no ano de 1981, Deuzimar era o Presidente de Honra da banda, ela tocava no surdo. Em 1982 foi estudar no colégio Padre Viana, na 5ª série e seu avó a estimulou tocar na banda do Colégio. Mas Fatinha tinha afinidade em tocar no tarol, mas seu avó a desafiou tocar o instrumento caixa e assim aconteceu, ela aceitou o desafio. Mas uma vez Fatinha retorna a falar do avó com carinho e revela: “quando eu chegava na casa do meu avô, ele se permitia se fazer que estava dormindo pra eu balançar ele na rede e cantar cantigas de ninar”. Esse fato aconteceu quando ela tinha a idade de 5 e 6 anos, os outros netos não faziam o que ela fazia, era muito amor envolvido. Pergunto em quais aspectos ela se parece com o avô ele diz que a facilidade de comunicação com as pessoas, e para falar em público, e este tinha a inspiração em falar em público. Descreve a inspiração da seguinte forma, de que quando está escrevendo vem aquela palavra e nem sabe de onde vem, mas que acredita que é teleguiada pelo mundo espiritual como seu avô era, são os Anjos da Guarda (denominação católica) e para Fatinha que é espirita são espíritos da Luz que lhe guia, seu avô tinha a crença na reencarnação apesar de ser católico. Inclusive ele indicou a Fatinha o livro dos espiritas, aos 13 anos de idade, por que ele era democrático e libertário, tinha a idéia que tinha que viver bem, em equilíbrio. Ela diz que seu pai também tinha os princípios de viver bem, e se identificava com o pai também. Recorda que aos 9 anos ganhou uma bicicleta e quando foi andar pela primeira, o pneu traseiro tinha duas rodinhas para apoio.  Fatinha deu uma volta no quarteirão com as duas rodinhas da bicicleta, ao retornar, pediu que o pai tirasse uma rodinha, deu outra volta no quarteirão e ao retornar pediu que ele retirasse a outra rodinha. E assim como era determinada conseguiu realizar a tarefa com êxito, e seu pai ficou aplaudindo. Perguntei se ela conheceu o engenho, mas diz que não traz as recordações, mas lembra do alfininho quente oferecido. Fiz essa referência pelo fato de Fatinha se dedicar a nossa história. Mas ela recorda de alguns fatos históricos como a praça do Jacaré, e outros que assim acompanhou e muitas coisas pertinentes a nossa história.

Fatinha ao descrever o período da sua adolescência e Juventude, percebe-se que seus pensamentos estavam a frente do tempo, uma jovem emancipada. Ela diz que foi uma maravilha, estudava no colégio Padre Viana, tinha um círculo de amizade muito bom, de pessoas que eram do colégio e de fora também. Não participava de movimento da Igreja, só frequentava, mas tinha uma crença aguçada na Astrologia, na Astronomia, a crença da reencarnação. Uma pessoa a frente do seu tempo suas leituras aos 15, 16 anos de idade eram revistas como Claudia, revista Nova, as quais não era comum as meninas da época. Já entendia de moda e de outras coisas e diz: “Eu criei um estilo próprio, de roupa e de vestir, sempre vivi no Brejo com a cabeça de outro lugar, uma mentalidade como alguém que morasse na capital, vive até hoje com uma cabeça que não é de Brejo Santo”, mas isso a manteve firme e não atingiu sua personalidade. Relata que foi discriminada pelo estilo, porque tinha o estilo de Ripe, saias longas, cabelo de tirinhas, usava brincos, sandálias de couro, bolsas de couro, aquilo era uma afronta pois era um estilo diferente e próprio. Como tinha apreço pela literatura, suas leituras eram Fernão Capelo Gaivota, Cristiane F, Aracelli meu Amor, o segredo da Borboleta, que só as mulheres de 25 anos liam. Com 18 anos já lia, Mariazinha a Maria de Marta Suplicy livro que construía a mulher que tinha que ser forte. Então, Fatinha tinha o pensamento de independência, autonomia, de liberdade, embora sempre apegada a família e aos princípios conservadores, mas driblava e vivia harmoniosamente bem com tudo isso.

Começou a trabalhar aos 13 anos de idade, começou na Loteria de Marleide sua cunhada, o salário era pequeno, dava pra merenda, mas achava bacana porque tudo isso ajudava a se firmar, e contribuía a ter responsabilidade. Desenvolveu várias atividades: foi balconista na loja SM Modas por 5 anos, loja que pertenceu a Samuel e sua Tia Aurileide. Aprendeu muito e agradece demais. Substituiu a mãe quando ele precisava, na maioria das vezes à noite, a veia educacional sempre caminhou junto. Cursou três faculdades, estudava e trabalhava, cursou Pedagogia na FACHUSC Faculdade de Ciências Humanas do Sertão Central em Salgueiro, Pernambuco, cursou História e Geografia Pela UVA – Universidade Vale do Acaraú, fez Serviço Social na Faculdade Leão Sampaio, e isso segundo ela, este curso veio “casar” com a história, para ela foi um presente muito grande e que através da pedagogia surgiu a pedagogia do afeto e com o complemento de Kardec, Pestalozzi e Rousseau. “Com a História me apaixonei pelos movimentos sociais, e o Serviço Social me ajudou a aceitar minha orientação sexual, a gostar como eu sou é e a me sentir importante dentro da minha orientação sexual, sou cidadã que contribui para o progresso do meu país, isso me faz ser leve hoje por que eu posso dizer quem eu sou e gostar de mim como eu sou, isso faz uma diferença enorme e isso é muito importante”. Então a construção de vida foi uma construção de sonhos e de luta e de realizações, enfatiza que é uma pessoa muito realizada. No Serviço Social foi a primeira aluna a colar grau por que passou no concurso de Juazeiro do Norte em primeiro lugar. Renunciou por conta dos pais, por ser apegada, e tinha que cuidar deles e não se arrepende nem um momento. Foi coordenadora de um CRAS, pela facilidade de trabalhar com as políticas públicas e com as pessoas menos favorecidas, desde a doutrina espírita, onde esteve por 9 anos em um Centro Espirita, e que fazia um trabalho social, com a equipe. Foram momentos difíceis, sofreram discriminação,  mas seguiram no silêncio e seguindo o Evangelho de Jesus Cristo, quem recebe amor tem que dar amor.


Sua história de escritora surge muito cedo. Escrevia poesias desde os 13 anos de idade, nas aulas de Filosofia do professor Tancredo Teles (seu primo), ele a  inspirava, pois quando ele entrava com seu jeito socrático ela já começava a escrever, era uma inspiração, e tirou dela o que estava guardado. Mas engavetou e voltou a escrever com muita intensidade quando seu pai adoeceu de Demência Senil e era uma dor muito grande em ver seu pai doente, e regredindo emocionalmente, a dor canalizou para a escrita. Eram 6 poemas por dia. Depois dessa entrega, resolveu publicar seu primeiro livro, apesar de que, já tinha lançado um quando lecionava na Escola Padre Pedro Inácio Ribeiro intitulado Minhas Fábulas, e a construção foi com os alunos. Outro livro foi Pedaços de Nossa História, que é um livro com aspectos históricos e geográficos e que serve de fonte de pesquisa para concursos, ajudou no de 2005. “Foi uma construção de cultura e literatura em Brejo Santo, e ai lancei meu primeiro livro Alumbramento”.  Fatinha é já recebeu vários títulos e com seu jeito diz: “digo sem soberba nenhuma, mas é um prazer muito grande em ser a primeira mulher brejossantenses a ter um assento na Academia de Letras do Brasil, Secção Ceará e sou a primeira mulher brejossantenses a ter um assento no Instituto Cultural do Cariri (ICC) onde dois brejossantenses tiveram assento que foi Otacílio Anselmo e Padre Antônio Gomes de Araújo, primeiros escritores mais antigos de nossa cidade. Tenho a felicidade de ter como patrono tanto nessas duas academias Academia de Letras do Brasil e no ICC o meu Avô José Teles de Carvalho. Sou a primeira mulher brejossantenses a ter assento na Academia de Internacional da União Cultural no Rio de Janeiro e o patrono é o meu avô”. Em outubro Fatinha Teles tomará assento no Instituto Cultural do Vale Carirense em Juazeiro do Norte. “Me sinto realizada, com esse caminho literário a minha primeira obra é Alumbramento que é um livro de poesia, que retrata a natureza como esta natureza está relacionada conosco, interligadas a ela”. O segundo livro de Fatinha foi na linha Infantil que fala sobre a história do Belém do Pará e a Lenda da Açai, ganhou o prêmio de literatura Infantil em 2018 pela editora ZL, no Rio de Janeiro recebeu o prêmio em Janeiro no Copacabana Palace Hotel, e o terceiro livro é o livro em homenagem a seu avô José Teles de Carvalho, pelo centenário e o escreveu no concurso da editora ZL em 2019, e concorreu com mais de 18 livros e na categoria biografia ele ganhou e vai receber o prêmio no Rio de Janeiro. O quarto livro escrito foi para atender ao concurso de Brejo Santo 2019, com o título Revisitando o Passado e Construindo o Presente, este tem aspectos históricos e geográficos do município para pesquisas. O Quinto livro vem coroar seus 50 anos, revela: “ele é especial, é pra nós mulheres que valoriza a nossa condição de mulher, vem reconhecer a nossa autonomia, vem reconhecer nossa força e a nossa luta. Lições de Marias um livro para mulheres e homens para que também possam ver nas mulheres a companheira a parceira, a mulher que luta igualmente com ele pelos seus direitos na condição construção da cidadania. 

Faço sempre a pergunta que é peculiar na coluna histórias do Cotidiano Quem é Fatima Teles: “Fátima Teles aos 50 anos é choro, alegria, 50 anos que perpassaram por desgosto, preconceito, muita luta, discriminações, mas de cabeça erguida, de esperança, na certeza de que amanhã é melhor que hoje sempre. Fatinha Teles, é tudo que faz parte da construção de vida dela, é pessoa de uma sensibilidade muito grande, com um profundo sentimento para as coisas do mundo e para as pessoas do mundo. Por sentir e ter tanto sentimento ela chora, tem raiva, sorrir, vibra, ama, desama, por que passeiam nela todos os sentimentos, mas acima de tudo o sentimento maior que ela leva para vida que é o amor. Porque aquilo que a gente tem é o que a gente tem que dar, tenho muito amor e sou uma pessoa extremamente amorosa, passeiam em mim harmoniosamente os rios e o sertão, por que eu sou uma mulher do sertão e uma Maria do sertão com o pensamento e a cabeça de uma Maria de capital vibrando sempre”. Atualmente trabalha na Secretaria Municipal da Educação Básica como formadora na Área de Ciências Humanas na equipe pedagógica firmando ainda mais seu trabalho voltado para a história da nossa educação.

Fatinha Teles, minha gratidão por me conceder o espaço de escrever um pouco sobre você, pessoa dotada de tanta sabedoria que me sinto lisonjeada em publicar suas palavras de escritora e de poetisa. Sua história faz parte da história da cidade e do nosso cotidiano, Parabéns pela passagem dos seus cinquenta anos cheio de muito amor.